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03 novembro 2012

Ainda a grande samaumeira dos Tikunas!

Márcia Kambeba, da etnia Omágua/Kambeba, o seu comentário encheu de alegria esse blog que fala sobre tudo... sobretudo de qualquer coisa. Mas nada tem sido mais gratificante do que receber comunicações como a sua, que dão a uma postagem antiga, de setembro de 2008, uma dimensão para além da intenção da humilde autora. Aquela samaumeira imensa, em pedaço da amazônia paraense, conquistou meu coração, à beira daquele Rio Guamá. E agora o rio volta e meia me traz um pouco de água fresca que lava o pensamento, carregando rio abaixo a ilusão da saudade. Em sua homenagem e a toda a sua linhagem nobre, publico aqui seu comentário e, logo abaixo, a postagem que tem sido um hit nesse blog.  E tomo a liberdade de divulgar aqui a sua dissertação de Mestrado no Programa de Pós Graduação da Universidade Federal do Amazonas - este sim é um trabalho importante e poderá servir de guia aos que passam pelas margens desse riozinho, e param para refrescar os sentidos nas bobagens desta tola Hanna. 
Para Márcia Kambeba e para todo o povo Tikuna (que eu escrevia com "c")
Amor.
H.

Link para a dissertação de Márcia Kambeba - Reterritorializacao e identidade do povo omagua-kambeba na aldeia tururucari uka


O COMENTÁRIO DE MÁRCIA SOBRE A POSTAGEM

"LINDO SEU TEXTO SOBRE O POVO TIKUNA. SOU TIKUNA DE CORAÇÃO POR TER NASCIDO EM ALDEIA TIKUNA EM BELÉM DO SOLIMÕES, MAIOR ALDEIA TIKUNA NO AMAZONAS, PRECISAMENTE ALTO SOLIMÕES. VIVI ENTRE OS TIKUNA ATÉ 8 ANOS DE IDADE E APRENDI MUITO. SOU DA ETNIA OMÁGUA/KAMBEBA, QUE HABITAM A REGIÃO DO ALTO SOLIMOES, E HOJE SOU MESTRA EM GEOGRAFIA E ESTUDEI MEU POVO EM UM PROCESSO DE RETERRITORIALIZAÇÃO E IDENTIDADE ÉTNICA... E A SAMAUMEIRA É PRESENTE NAS LENDAS DO MEU POVO, NOS MITOS... CONTAM OS MAIS VELHOS QUE NÓS NOS ORIGINAMOS DE UMA GOTA D'ÁGUA QUE CAIU EM UMA FOLHA DE SAMAUMEIRA E EM SEGUIDA NO IGARAPÉ, SE DIVIDIU EM 2 PARTÍCULAS E NASCERAM O HOMEM E A MULHER.. ESTÁ NA MINHA DISSERTAÇÃO SENDO REPRESENTADO ATRAVÉS DE UM DESNHO POR UM DOS IND''IGENAS DA ALDEIA KAMBEBA... MÁRCIA KAMBEBA".

REEDIÇÃO DA POSTAGEM, AGORA EM OUTRO TEMPO, OUTRAS URGÊNCIAS
EM HOMENAGEM AOS GUARANI-KAIOWÁ -  QUE VENÇAM A BATALHA!

Samaumeira é o nome desta grande árvore que fotografei apenas por encantamento. Se conhecesse a história, talvez tivesse feito fotos melhores... ou me perdido por lá. A grande samaumeira dos índios ticunas é parte de uma lenda belíssima que fala de resistência e imortalidade. Para os índios, as árvores desepenhavam papel fundamental no universo. Os galhos fortes da gigantesca samaumeira, por exemplo, sustentavam o céu com todos os seus astros . A lenda sobre essa árvore soberba pode ser lida numa obra de 1985, escrita pelos próprios ticunas e publicada pelo Museu Nacional (RJ) . O livro, chamado 
Nosso Povo, narra a lenda que conta como apareceu o dia e a história do coração da samaumeira. Quase ninguém com quem falei aqui em Belém sabia sequer o nome da árvore, que dirá a história mítica e linda que ela guarda. Alguns ainda disseram: " é uma árvore centenária que todo mundo diz que tem coração". Como fomos aprender tanto sobre minotauros e medéias e não conhecíamos o coração da samaumeira que sustenta o firmamento e que ainda hoje nos contempla em sua altivez, no meio de uma floresta que o mundo inteiro conhece? Precisamos descobrir o Brasil, antes que os aventureiros lancem mão. E faço a minha pequena parte, postando o resultado da pesquisa para saber que árvore maravilhosa era aquela.

Lendas desconhecidas de uma terra chamada Brasil

Como apareceu o dia. Naquele tempo era sempre noite. Os galhos da samaumeira cobriam o mundo, escurecendo tudo. Os irmãos Yoi e Ipi tentaram abrir um buraco na copa da árvore, jogando-lhe caroços de araratucupi, mas sem resultado. Chamaram o pica-pau, que tentou cortar o tronco com o bico, mas não conseguiu. Resolveram então tirar o machado da cutia. Ipi colou penas em todo o corpo e ficou deitado de boca aberta no caminho da cutia. A cutia estranhou a figura que encontrou no caminho e começou a fazer-lhe perguntas. Como Ipi não respondesse, ameaçou urinar na boca dele, cortar-lhe a língua, até que ele respondeu, dizendo que podia arrancá-la. Ela se aproximou e Ipi arrancou-lhe a paleta, a perna de trás, que era o seu machado. A cutia perseguiu Ipi mancando e gritou-lhe que, quando fizesse roça, não dissesse o nome dela, e que ela iria cobrar-lhe o roubo, furtando nas roças que fizesse. É o que a cutia faz até hoje. A cutia não pode mais plantar. Só cutia pequena ainda tem o machado. De posse do machado, Ipi começou a cortar a árvore. Mas o corte se tornava a fechar. Yoi então tentou cortar e, onde ele batia, o corte se mantinha aberto. Quando se cansou, entregou o machado a Ipi, que continuou a cortar, mas agora o corte não se fechava mais. Apesar de o tronco estar bem fino, a árvore não caía. Olhando para cima, viram que era uma preguiça que a segurava. O quatipuru, convidado para subir e tirar a mão da perguiça do galho, foi até a metade e desceu, com medo da altura. O quatipuru pequeno aceitou subir com formigas de fogo para jogar nos olhos da preguiça. Ele subiu e conseguiu atingir os olhos da preguiça. Deu então um pulo para trás e caiu, machucando o rabo no machado. Por isso o quatipuruzinho tem o rabo dobrado nas costas. A samaumeira caiu, e daí por diante se pôde ver o sol, o céu, as estrelas. Como recompensa, Yoi e Ipoi deram sua irmã para casar com o quatipuruzinho.
O coração da samaumeira. Depois de algum tempo, Ipi foi até a árvore derrubada para ver se já tinha apodrecido. Mas ela estava viva e tinha começado a brotar de novo. Ipi ouviu batidas de coração e resolveu tirá-lo. E começou a cortar com o machado. Ipi e Yoi disputavam o machado, cada qual querendo a tarefa de tirar o coração da samaumeira. Finalmente um golpe de Yoi fez o coração pular fora. Um calango o engoliu e ele ficou parado na garganta. Ipi encostou um tição na garganta do calango e o coração pulou fora. Mas uma grande borboleta azul engoliu o coração. Ipi queimou a asa da borboleta com o mesmo tição e ela vomitou. Por isso as borboletas azuis de hoje têm manchas na asa. O coração caiu num buraco muito apertado. Yoi então mandou a cotia roer o coração pelo lado direito, trazer o caroço e plantar no terreiro. Passado algum tempo, daí nasceu a árvore de umari.
O mito da grande samaumeira e o de seu coração também estão divulgados em O Livro das Árvores (Benjamin Constant: OGPTB, 1997), um volume escrito e ilustrado pelos professores indígenas ticunas, que trata da importância das árvores na vida e cultura de seu povo. Entre as suas muitas ilustrações, há um desenho da árvore Tchaparane, que produzia terçados. Ela ficava em Cujaru, um lugar perto do rio Jacurapá, e as pessoas iam até lá e esperavam que caíssem no chão.
Fonte: http://www.geocities.com/RainForest/Jungle/6885/mitos/m08arvor.htm

SOBRE OS TICUNAS
Os Ticunas constituem, hoje, a maior nação indígena do Brasil com mais de 32 mil pessoas. Eles são encontrados também na Colômbia e no Peru. No Brasil, estão localizados no estado do Amazonas, ao longo do rio Solimões, em terras dos municípios de Benjamin Constant, Tabatinga, São Paulo de Olivença, Amaturá, Santo Antônio do Içá, Fonte Boa, Anamã e Beruri. Os Ticunas falam uma língua considerada isolada, que não mantém semelhança com nenhuma outra língua indígena. Sua característica principal é o uso de diferentes alturas na voz, peculiaridade que a classifica como uma língua tonal. Os Ticuna estão organizados em clãs, ou "nações", agrupados em metades, que regulam os casamentos. Membros de uma metade devem casar-se com pessoas da metade oposta, e seus filhos herdam o clã do pai. Numa das metades agrupam-se os clãs com nomes de aves: mutum, maguari, arara, japó etc. Na outra metade estão os clãs que possuem nomes de plantas e de animais, como o buriti, jenipapo, avaí, onça, saúva.
O texto completo sobre os índios ticuna pode ser visto no site http://www.rosanevolpatto.trd.br/ticuna1.htm

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