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19 novembro 2009

Historinhas curtas de Cortázar

Vou a um lugar que não conheço e onde jamais passei. Abro as palavras de Cortázar sobre a mesa, como quem abre um mapa que poderá guiar toda a viagem. Deixo aberta a janela para que o vento possa mover as linhas que demarcam a região, escrevendo sobre as palavras que o lugar certo é ali. Julio Cortázar nasceu na Bélgica, de pais argentinos.  Apesar de ter nascido  geograficamente em outro país, ele é argentino porque o parto foi na embaixada argentina em Ixielles, distrito de Bruxelas. Cortázar começou a escrever poesias aos nove anos de idade e é considerado um dos grande mitos da literatura moderna.  Ao lado de Jorge Luis Borges, ele  influenciou toda uma geração que lutava pela liberdade na América Latina, durante o período das ditaduras. Um de seus livros mais famosos é o fantástico Jogo da Amarelinha, que pode começar a ser lido a partir de qualquer parte, em qualquer ordem,  desvendando em cada uma um sentido novo. Cortázar também escreveu contos e histórias curtas, das quais posto estas duas  aí embaixo. Se eu não for acometida pela liberdade de prometer e não entregar, como geralmente acontece, prometo passear com vocês por alguns autores argentinos, porque é pra lá que eu vou (humm, peguei vocês...rsrs. Pensaram que eu ia pra Bélgica e não voltaria mais, né?..rsrs). Então, fiquem com as historinhas curtas de Cortázar e reparem que bela imagem poética ele construiu: "...eu sinto você tremular contra mim, como uma lua na água". Mágico, não?
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"Até agora, nunca tinha amado as suas amantes; havia algo nele que o levava a tomá-las demasiado depressa para ter tempo de criar a aura, a zona necessária de mistério e desejo que lhe permitisse organizar mentalmente aquilo que poderia um dia chamar-se amor".




"Toco a sua boca com um dedo, toco o contorno da sua boca, vou desenhando essa boca como se estivesse saindo da minha mão, como se, pela primeira vez, a sua boca entreabrisse, e basta-me fechar os olhos para desfazer tudo e recomeçar. Faço nascer, de cada vez, a boca que desejo, a boca que minha mão escolheu e desenha no seu rosto, uma boca eleita entre todas, com soberana liberdade, eleita por mim para desenhá-la com minha mão em seu rosto, e que, por um acaso, que não procuro compreender, coincide exatamente com a sua boca, que sorri debaixo daquela que minha mão desenha em você. Você me olha, de perto me olha, cada vez mais de perto, e então brincamos de ciclope, olhamo-nos cada vez mais de perto e nossos olhos se tornam maiores, se aproximam uns dos outros, sobrepõe-se, e os ciclopes se olham, respirando confundidos, as bocas encontram-se e lutam debilmente, mordendo-se com os lábios, apoiando ligeiramente a língua nos dentes, brincando nas suas cavernas, onde um ar pesado vai e vem, com um perfume antigo e um grande silêncio. Então as minhas mãos procuram afogar-se no seu cabelo, acariciar lentamente a profundidade do seu cabelo, enquanto nos beijamos como se estivéssemos com a boca cheia de flores ou de peixes, de movimentos vivos, de fragrância obscura. E se nos mordemos, a dor é doce; e se nos afogamos num breve e terrível absorver simultâneo de fôlego, essa instantânea morte é bela. E já existe uma só saliva e um só sabor de fruta madura, e eu sinto você tremular contra mim, como uma lua na água".

Pesquisinha básica sobre outra obra maravilhosa de Julio Cortázar, direto da Wikipedia para os curiosos e preguiçosos. Vou reler este livro hoje... na praia!

"O livro Histórias de Cronópios e de Famas foi escrito por Cortázar em Roma e Paris, no período de 1952 a 1959, mas foi publicado em 1962. Ofereceu uma espécie de reinvenção do mundo através de seus personagens, os "cronópios", os "famas" e as "esperanças", que alcançam sensibilidade e fascínio na medida em que traduzem a psicologia humana. Os cronópios, segundo Cortázar, são criaturas verdes e úmidas, distraídas, e sua força é a poesia. Eles cantam como as cigarras, indiferentes ao cotidiano, esquecem tudo, são atropelados, choram, perdem o que trazem nos bolsos e, quando saem em viagem, perdem o trem, chove a cântaros, levam coisas que não lhes servem. Os famas, pelo contrário, são organizados e práticos, prudentes, fazem cálculos e embalsamam sua lembranças; quando fazem uma viagem, mandam alguém na frente para verificar os preços e a cor dos lençóis.
As esperanças "são sedentárias e deixam-se viajar pelas coisas e pelos homens, e são como as estátuas, que é preciso ir vê-las, porque elas não vêm até nós"

E para os que gostaram desta prévia, segue a bibliografia das principais obras deste genial escritor argentino, com os links originais da fonte da pesquisa:

Besos calientes  e contentes de Hanna!!!!

2 comentários:

Coletivo Cronópio disse...

Olá Hanna,
estava passeando pelos blogs e encontrei sua postagem sobre o Cortázar. Entre no blog da nossa cia de teatro. Acabamos de montar uma peça inspirada no História de Cronópios e de Famas. Engraçado que quando li o subtítulo do seu blog achei a cara desse livro.
beijos
www.coletivocronopio.blogspot.com

Hanna disse...

Olá! Sejam bem vindos! Gosto muito do Cortázar e especialmente deste livro, História de Cronópios e de Famas. Não estava pensando nele quando escrevi o subtítulo, mas vai ver que sou influenciada pelo estilo de Cortázar. Nesta vida nada se cria...rs. Adorei sua visita. Vou visitar o blog de vocês também.
Bjs.
H.