Páginas

21 dezembro 2016

Uma árvore Ticuna plantada no meu coração

Publiquei esse texto em 2008, mas até hoje continuo recebendo algum comentário ou mensagem sobre a lenda da bela árvore dos índios Ticuna. Hoje recebi uma mensagem do Rainel Costa da Silva, que diz o seguinte: "Amei,o post sou kambeba, da cidade de são Paulo de Olivença, mas meu sangue é tikuna, meu avô é tikuna, mais cresceu em uma comunidade kambeba, ele aprendeu apenas a falar a língua geral; ele contava e até agora conta a história de yoi e ipi. Nömãë!!"

Fiquei feliz de receber seu comentário, Rainel! E como parece que você ficou feliz com o post, vou republicar para que mais pessoas possam, quem sabe, também gostar e sentirem-se felizes.
Um grande beijo aos que leram e comentaram.
Um feliz Natal, com o amor de sempre.
Hanna

O universo no coração dos Ticuna 

Samaumeira - ou samaúma -  é o nome desta grande árvore que fotografei apenas por encantamento. Se conhecesse a história, talvez tivesse feito fotos melhores... ou me perdido por lá. A grande samaumeira dos índios ticunas é parte de uma lenda belíssima que fala de resistência e imortalidade. Para os índios, as árvores desempenhavam papel fundamental no universo. Os galhos fortes da gigantesca samaumeira, por exemplo, sustentavam o céu com todos os seus astros. A lenda sobre essa árvore soberba pode ser lida numa obra de 1985, escrita pelos próprios ticunas e publicada pelo Museu Nacional (RJ) . O livro, chamado Nosso Povo, narra a lenda que conta como nasceu o dia e a história do coração da samaumeira. Quase ninguém com quem falei aqui em Belém sabia sequer o nome da árvore, que dirá a história mítica e linda que ela guarda. Alguns ainda disseram: "é uma árvore centenária que todo mundo diz que tem coração". Como fomos aprender tanto sobre minotauros e medeias e não conhecíamos o coração da samaumeira que sustenta o firmamento e que ainda hoje nos contempla em sua altivez, no meio de uma floresta que o mundo inteiro conhece? Precisamos descobrir o Brasil, antes que os aventureiros lancem mão. E faço a minha pequena parte, postando o resultado da pesquisa para saber que árvore maravilhosa era aquela.

Lendas desconhecidas de uma terra chamada Brasil

Como apareceu o dia. Naquele tempo era sempre noite. Os galhos da samaumeira cobriam o mundo, escurecendo tudo. Os irmãos Yoi e Ipi tentaram abrir um buraco na copa da árvore, jogando-lhe caroços de araratucupi, mas sem resultado. Chamaram o pica-pau, que tentou cortar o tronco com o bico, mas não conseguiu. Resolveram então tirar o machado da cutia. Ipi colou penas em todo o corpo e ficou deitado de boca aberta no caminho da cutia. A cutia estranhou a figura que encontrou no caminho e começou a fazer-lhe perguntas. Como Ipi não respondesse, ameaçou urinar na boca dele, cortar-lhe a língua, até que ele respondeu, dizendo que podia arrancá-la. Ela se aproximou e Ipi arrancou-lhe a paleta, a perna de trás, que era o seu machado. A cutia perseguiu Ipi mancando e gritou-lhe que, quando fizesse roça, não dissesse o nome dela, e que ela iria cobrar-lhe o roubo, furtando nas roças que fizesse. É o que a cutia faz até hoje. A cutia não pode mais plantar. Só cutia pequena ainda tem o machado. De posse do machado, Ipi começou a cortar a árvore. Mas o corte se tornava a fechar. Yoi então tentou cortar e, onde ele batia, o corte se mantinha aberto. Quando se cansou, entregou o machado a Ipi, que continuou a cortar, mas agora o corte não se fechava mais. Apesar de o tronco estar bem fino, a árvore não caía. Olhando para cima, viram que era uma preguiça que a segurava. O quatipuru, convidado para subir e tirar a mão da perguiça do galho, foi até a metade e desceu, com medo da altura. O quatipuru pequeno aceitou subir com formigas de fogo para jogar nos olhos da preguiça. Ele subiu e conseguiu atingir os olhos da preguiça. Deu então um pulo para trás e caiu, machucando o rabo no machado. Por isso o quatipuruzinho tem o rabo dobrado nas costas. A samaumeira caiu, e daí por diante se pôde ver o sol, o céu, as estrelas. Como recompensa, Yoi e Ipoi deram sua irmã para casar com o quatipuruzinho.
O coração da samaumeira. Depois de algum tempo, Ipi foi até a árvore derrubada para ver se já tinha apodrecido. Mas ela estava viva e tinha começado a brotar de novo. Ipi ouviu batidas de coração e resolveu tirá-lo. E começou a cortar com o machado. Ipi e Yoi disputavam o machado, cada qual querendo a tarefa de tirar o coração da samaumeira. Finalmente um golpe de Yoi fez o coração pular fora. Um calango o engoliu e ele ficou parado na garganta. Ipi encostou um tição na garganta do calango e o coração pulou fora. Mas uma grande borboleta azul engoliu o coração. Ipi queimou a asa da borboleta com o mesmo tição e ela vomitou. Por isso as borboletas azuis de hoje têm manchas na asa. O coração caiu num buraco muito apertado. Yoi então mandou a cotia roer o coração pelo lado direito, trazer o caroço e plantar no terreiro. Passado algum tempo, daí nasceu a árvore de umari.

O mito da grande samaumeira e o de seu coração também estão divulgados em O Livro das Árvores (Benjamin Constant: OGPTB, 1997), um volume escrito e ilustrado pelos professores indígenas ticunas, que trata da importância das árvores na vida e cultura de seu povo. Entre as suas muitas ilustrações, há um desenho da árvore Tchaparane, que produzia terçados. Ela ficava em Cujaru, um lugar perto do rio Jacurapá, e as pessoas iam até lá e esperavam que caíssem no chão.

Fonte: http://www.geocities.com/RainForest/Jungle/6885/mitos/m08arvor.htm

Sobre os ticunas
Os Ticunas constituem, hoje, a maior nação indígena do Brasil com mais de 32 mil pessoas. Eles são encontrados também na Colômbia e no Peru. No Brasil, estão localizados no estado do Amazonas, ao longo do rio Solimões, em terras dos municípios de Benjamin Constant, Tabatinga, São Paulo de Olivença, Amaturá, Santo Antônio do Içá, Fonte Boa, Anamã e Beruri. Os Ticunas falam uma língua considerada isolada, que não mantém semelhança com nenhuma outra língua indígena. Sua característica principal é o uso de diferentes alturas na voz, peculiaridade que a classifica como uma língua tonal. Os Ticuna estão organizados em clãs, ou "nações", agrupados em metades, que regulam os casamentos. Membros de uma metade devem casar-se com pessoas da metade oposta, e seus filhos herdam o clã do pai. Numa das metades agrupam-se os clãs com nomes de aves: mutum, maguari, arara, japó etc. Na outra metade estão os clãs que possuem nomes de plantas e de animais, como o buriti, jenipapo, avaí, onça, saúva.

O texto completo sobre os índios ticuna pode ser visto no site http://www.rosanevolpatto.trd.br/ticuna1.htm

15 janeiro 2016

Do amor e sua infinita graça

Amar é plenitude e assim se basta. Amar é deixar que se desfaçam as amarras que empurram a vida para a margem da vida, ali por onde o passado e os não acontecimentos arrastam suas correntes. Amar é apenas deixar que a vida flua para dentro, em torno e através de nós, derrubando muralhas de incerteza. Felizes aqueles que portam esse vaso transbordante. A estes, o universo convida a dançar.
Para os que foram tangidos por tão divina graça, um campo imenso de lindos girassóis.
Amor de sempre.
H

27 agosto 2015

Assim tão de repente

Sussurram os não ditos em uníssono
Afligem-me os ouvidos, que ouvem reticentes
É para dar atenção?
Entre a razão e a estrada deserta, a sombra das árvores do silêncio.
Bastam os sons dispersos, distantes, desconhecidos.
Não precisam de atenção.
Onde está o ruído grave, som distorcido que berra impropérios de vida?
Onde está o barulho das almas, dos cães que ladram e nunca mordem?
Onde se escondeu a coragem dos temores sussurrantes?
Onde está a resposta a perguntas impertinentes?
Não. Perguntas equivocadas não carecem de respostas.

08 abril 2015

Se tenho medo
(John Keats)

Se tenho medo de meus dias terminar
   Antes de a pena me aliviar o espírito, antes
De muito livro, em alta pilha, me encerrar
   Os grãos maduros como em silos transbordantes;
Se vejo, nas feições da noite constelar,
   Enormes símbolos nublados de um romance
E penso que não viverei para copiar
   As suas sombras com a mão maga de um relance;
Quando sinto que nunca mais hei de te ver,
   Formosa criatura de um momento ideal!
Nem hei de saborear o mítico poder
   Do amor irrefletido! - então no litoral
Do vasto mundo eu fico só, a meditar,
Até ir Fama e Amor no nada naufragar.

14 março 2015

Catando poesia no chão...


Achei enquanto andava em um bosque de Brasília. O autor, pelo que deu para entender da assinatura, é João Blenner. E agora chove lá fora... muito.
H.
PS: ...no chão da alma.

11 março 2015

O que basta...

A poesia que me atravessa é de tal forma intensa, que chego a duvidar de minha própria humanidade.
O amor que me habita é tão imenso, que me afogo em solidão e impossibilidades - a que devo?
Ave tempo que me trascende; ave o desconhecido, o descalabro - vida, o que é então, se mais que nada que a si se basta?
H.

02 março 2015

Demasiadamente humano

Nietzsche foi um dos filósofos mais importantes do Século XIX. Ele era um monte de coisas mais além de filósofo – poeta, por exemplo. Dos seus escritos filosóficos pode-se ver que não tinha muita paciência para lidar com as ideias acomodadas e com as teorias de consenso – aliás, nem eu tenho paciência para a mesmice acadêmica – eu, logo eu. Escrever é um ato de coragem, que às vezes devo confessar que me falta. Preguiça intelectual, talvez preguiça moral... ou simplesmente preguiça de me embrenhar em discussões inúteis que me estressam as veias. Ou apenas preguiça daquelas simples e baratas, sem nada mais que a possa adjetivar. Nietzsche morreu muito jovem. Tinha 44 anos quando entrou em colapso e perdeu completamente a capacidade mental. Isso foi em 1889; ele morreu em 1900. Triste sina... conspiração do universo; pensou o que podia no tempo que lhe cabia e desautorizou Deus com sua vontade de potência:"Esse mundo é a vontade de potência — e nada além disso! E também vós próprios sois essa vontade de potência — e nada além disso!”
Gosto particularmente dos aforismos em "Humano, demasiado humano", onde as verdades se mostram ligeiras, ágeis, desafiadoras e finas como uma espada de esgrima: "Toda crença no valor e na dignidade da vida se baseia num pensar inexato; (...) porque cada um quer e afirma somente a si mesmo".

Talvez daí venha a minha preguiça – qualquer esforço é apenas a tentativa de afirmação de si mesmo; uma grande bobagem. Mas vamos à poesia, que é a afirmação da alma, onde se guarda a pureza das verdades tolas, inauditas, belas, simples – mesmo em Nietzsche, porque humano, demasiadamente humano.

Ninguém pode construir em teu lugar
as pontes que precisarás passar
para atravessar o rio da vida -
ninguém, exceto tu, só tu.
Existem, por certo, atalhos sem número
e pontes, e semideuses que se oferecerão
para levar-te além do rio;
mas isso te custaria a tua própria pessoa;
tu te hipotecarias e te perderias.
Existe no mundo um único caminho
por onde só tu podes passar.
Aonde leva? Não perguntes, segue-o.
(Nietzsche)

No mais, beijos de Hanna em profusão.


28 fevereiro 2015

Viagem...voragem

Alguma coisa acontece... sempre. E é bom que seja assim, para que nossos olhos não fiquem demasiadamente voltados a uma cena única. O mundo é cheio de ilusões, e às vezes temos o impulso de trocar todo um longo percurso já vencido por momentos parcos de descanso, aconchego, paixão, alegria, volúpia, prazer, gozo, sono, preguiça - catarses e aflições de espírito, que a permanência engendra e nos faz desejar, com toda a ênfase de quem merece o prêmio. Hora de voltar à estação e esperar o aviso do trem. Malas abertas, saltam velhas lembranças que lá foram esquecidas ao longo de tantas viagens. E todas cantam alguma música para distrair a memória; acalanto, canções de ninar.Vida louca, vida breve... Eu vou descendo por todas as ruas e vou tomar aquele velho navio...Um dia eu volto, quem sabe... O vento vai levando tudo embora... Mas a vida continua e se entregar é uma bobagem!
Olha só o que eu achei...

H.


10 janeiro 2015

O general, o poeta e o cantor...sobre (in)certezas

Ah! Esqueci do lead! Na postagem aí embaixo, eu pretendia dizer que ao tentarmos nos lançar ao que desejamos, ou quando decidimos tomar decisões para resolver questões fundamentais que sempre adiamos, é comum gelar de medo, insegurança, como crianças assustadas. E a situação fica pior ainda quando, depois de vencermos esta primeira etapa, temos que decidir o que fazer da vida! Já pensou em quantas vezes você desistiu no meio de um caminho que estava quase levando você até lá? Pois é. Aprendemos a desacreditar de nossas competências, embora tenham sido elas que nos trouxeram até aqui e nos fizeram sobreviver a todos os percalços efetivamente vividos. E isso às vezes resulta em depressão, em desânimo crônico. Uma espécie de "eu quero a minha mãe!!!", figura simbólica da proteção e amparo. Às vezes, apenas simbólica mesmo. Mas a nossa mente desamparada diante da decisão de assumir o comando quer voltar para o colo a qualquer preço, seja lá que colo for. E adiamos viver, voltando para um playground imaginário, onde alguém está cuidando de "tudo" - tudo o que você adiou, porque, se prestar bem atenção, você continua dando conta de estar no mundo, seja lá como for, porque viver é preciso, embora não seja exato. Que tal pegar estes instrumentos de navegação e planejar uma viagem para fora dos playgrounds onde andou se escondendo, hein?
Nossa, fiz lá embaixo um nariz de cera tão grande que esqueci do lide...rs. Mas agora que você já leu o lide, que tal dar uma passadinha no nariz de cera aí embaixo? Se não gostar do texto, tem Fernando Pessoa e Caetano Veloso para compensar. Vai lá!
Bom fim de semana, com o amor de sempre.

H.